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terça-feira, 11 de agosto de 2009

 

O ÚNICO PUNIDO FOI O JORNAL

O único punido foi um jornal *CARLOS ALBERTO DI FRANCO

O desembargador Dácio Vieira, do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT), proibiu o jornal "O Estado de S. Paulo" de publicar reportagens que contenham informações da Operação Boi Barrica, da Polícia Federal. A medida judicial, que pôs o jornal sob censura, foi solicitada pelo empresário Fernando Sarney, filho do presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP) - que está no epicentro da crise que fustiga o Congresso.



O desejo de Fernando Sarney foi satisfeito com a velocidade de uma corrida de Fórmula 1. O pedido entrou numa quinta-feira, no fim do dia. E na sexta-feira pela manhã a liminar havia sido concedida pelo magistrado. Ex-consultor jurídico do Senado, o desembargador Dácio Vieira, que concedeu a liminar a favor de Fernando Sarney e pôs o jornal sob censura, é do convívio social da família Sarney e do ex-diretor-geral do Senado Agaciel Maia. Sarney, o desembargador Dácio Vieira e Agaciel Maia, pivô do escândalo dos atos secretos, aparecem juntos em foto da festa do casamento de Mayanna, filha de Agaciel Maia. A fotografia foi publicada numa coluna social do "Jornal de Brasília", três dias após o casamento. Ao lado deles, compondo a foto, estava o senador Renan Calheiros (PMDB-AL).



Eis, caros leitores, os personagens que compõem um quadro de suspeição judicial clamorosa. Ademais, a liminar foi uma agressão à liberdade de imprensa, valor expressamente garantido pelo artigo 220 Constituição. O legislador sublinhou inequivocamente que "nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de comunicação social".



Além de inconstitucional, a censura à imprensa está na contramão do anseio de limpidez no comportamento dos homens públicos que domina a sociedade. A experiência demonstra, mais uma vez com o episódio dos atos secretos do Senado e seus escabrosos desdobramentos, que a escassez de informação tem sido uma aliada da impunidade.



Mas não é só a família Sarney que promove o cerceamento da liberdade de imprensa. O governo Lula, aliado aberto do presidente do Senado e leniente com inúmeros casos de corrupção, manifesta notável simpatia pelo governo ditatorial da Venezuela. O recente ataque à TV Globovisión e o fechamento de 34 rádios na Venezuela receberam críticas de entidades como a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA e a Sociedade Interamericana de Imprensa e até de governantes pró-Chávez, como o paraguaio Fernando Lugo. Já o governo Lula, por meio do assessor da Presidência Marco Aurélio Garcia, defendeu Chávez: "Se acabou (a liberdade de imprensa), deve ter sido depois que eu saí. O que ouvi em programas de TV sendo dito sobre o presidente da Venezuela não está no gibi", disse Garcia, recém-chegado da "democrática" Venezuela.



Iludem-se os que imaginam que a impunidade será protegida pelo manto do silêncio. O que a opinião pública exige não é menos jornalismo, mas mais informação. O senador Pedro Simon foi certeiro ao se referir ao melancólico comportamento do senador José Sarney: "O homem da transição democrática agora cometeu um ato de ditadura. Ele perdeu seu último argumento."



O que se pretendeu com a censura ao jornal foi algemar a verdade e amordaçar os valores éticos que estão gritando nas gargantas de milhões de brasileiros decentes. Uma onda de podridão avança sobre o Senado e envergonha o Brasil. Acende-se, mais uma vez, o forno para esquentar a pizza da iniquidade. O único punido foi um jornal.



A sociedade, ao contrário do que pensam os defensores do pragmatismo aético e da governabilidade sem princípios e sem decência, pode emergir desses escândalos num patamar superior. Graças ao papel histórico da imprensa e à legítima pressão da opinião pública, o Brasil não será o mesmo. E o efeito cascata, assim espero, será irreversível. Os brasileiros darão sua resposta nas eleições de 2010.

*CARLOS ALBERTO DI FRANCO é diretor do Master em Jornalismo do Jornal O GLOBO10 de agosto de 2009 (segunda-feira)

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